A morte para cada ser humano tem uma razão individual de ser.
O fato de passar a ter consciência da efemeridade da minha existência, na qual o amanhã pode ser o fim, passou a despertar em mim a certeza de que a minha vida, esta que eu estou vivendo hoje, que faz parte da minha realidade concretamente, é única, irrecuperável, importantíssima e pessoal.
Independentemente da questão fé/ religião, que nos dá várias alternativas de esperança quanto à vida pós morte, pus-me a valorizar as relações, os meus momentos, a fazer valer a pena cada dia, cada palavra, cada atitude, uma capacidade maior de empatia, como se esta vida limitada que eu tenho nas mãos fosse o meu maior presente e dependesse exclusivamente de mim.
Viver a vida é, entre outras coisas (e sobretudo, quem sabe?), buscar a vida feliz e não meramente sobreviver (…) A vida boa, a vida feliz – a vida que merece ser preservada, nutrida, comunicada, reproduzida e festejada- é o desfrute compartilhado do afeto, da companhia, do trabalho, do alimento, do descanso, da arte… Enfim, da festa!
A vida boa, a vida feliz, é também a aptidão para assumir criativamente o sofrimento pessoal como dimensão intrínseca da própria vida. É, igualmente, disposição para apreciar e acompanhar a aflição dos outros com solidariedade e ternura. Mas a vida boa é, também, esforço para superar o sofrimento injusto e evitar o sofrimento desnecessário.
Perder alguém ou trabalhar a perda de alguém continua sendo imensamente doloroso, mas cada vez que ela se faz presente como ruptura angustiante e sem solução, é para a vida que a morte me remete, para o sentido da minha existência, para o meu crescimento enquanto ser humano. Acredito que a proximidade com ela, proporcionou não só a mim, mas a todos terapeutas, maiores condições de orientar, assistir e incentivar aos que sofrem pela perda do ente querido a refletirem a própria vida, a se encorajarem em enfrentar as perdas, a também valorizarem cada momento, já que, como todos dizem, estamos aqui de passagem, somos peregrinos, nosso descanso não é aqui, mas, que possamos viver amplamente também nesta vida.
A evidência da morte não só nos deixa pensativos como nos torna pensadores. Por um lado, a consciência da morte nos faz amadurecer pessoalmente, por outro lado, a certeza pessoal da morte nos humaniza, ou seja, nos transforma em verdadeiros humanos, em “mortais”. É justamente a certeza da morte que faz da vida – minha vida, única e irrepetível – algo tão mortalmente importante para mim, ela serve para nos fazer pensar, mas não sobre a morte e sim sobre a vida, oferecendo-nos a alternativa mortal de compreender esta vida. Lidar com morte nos ensina viver.